terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Damas do Samba - Mulheres bordando a cultura do Rio Emocionante. É o que posso dizer do documentário Damas do Samba, de Suzanna Lira. E a emoção é tão grande que bate qual surdo no peito e transborda. É o que faço agora. Damas do Samba não fala do samba como ritmo musical ou da presença glamorosa das mulheres nesse universo. Fala da beleza retratada pelas mulheres do samba e, através delas, da resistência tomada pela mão ao assumir o protagonismo da construção da história da cultura do Rio de Janeiro. Susanna que só as sábias tias e avós são capazes de confeccionar, ela nos faz sentir parte da obra. As novas e antigas gerações se alternam: como paninhos de adorno, caminhos de mesa ou ricas toalhas de sala de jantar a contar lindas histórias. Como toda boa bordadeira, Suzanna tem acabamento perfeito. Seja do direito ou do avesso, não consigo reconhecer restos de linha, arremates mal feitos. Tudo é tratado, por essa bordadeira-documentarista, com respeito e capricho. Damas do Samba deixa para suas herdeiras diretas e para todas as mulheres um lindo e rico enxoval. Algumas o usarão dando-lhe o verdadeiro destaque. Privilegiando e valorizando os espaços nobres da casa. Dando-lhe respeitoso destino. Outras, por sua vez, talvez não se interessem tanto. Não lhe atribuam serventia. Tão pouco reconheçam seu real valor. Mas há de haver aquelas que se interessarão em perpetuar o ofício, tornando-se bordadeiras da história e guardiãs de sua memória. Preocupadas em observar o detalhe; com os tipos de pontos utilizados; com as técnicas empregadas em sua construção e confecção, buscando fazer peças cada vez mais bonitas. Com o mesmo cuidado, talento e acabamento. Saberão quem foram suas precursoras, sua importância para a cultura do Rio de Janeiro e se reconhecerão nelas. E, por respeito, admiração e consciência, assumirão para si o protagonismo e a responsabilidade de tocar o barco da resistência. Além de um maravilhoso documentário Suzanna Lira nos deixa um inestimável legado: documenta, registra e garante a preservação da história bebendo primordialmente da fonte da oralidade. Damas do Samba desencadeia reflexões e convida a uma tomada de atitude. Me fez chorar de emoção. Aplaudi e transBORDEI !
Ouço seu canto ao desembarcar no cais... Sempre imagino baleias em seus passeios diários pelo mar da Baía de Guanabara. Por demais poético? Ouço seu canto ao desembarcar na plataforma IV da Praça XV... Melhor assim ou que cada um faça suas próprias imagens... E mesmo que outros sequer se importem, seus gemidos soam sempre como música aos meus ouvidos. Mesmo com rima, todo esse encantamento dura muito pouco. Não posso dizer o mesmo em relação aos fragmentos das conversas capturadas durante a viagem. A vida alheia faz parte do cardápio e é servida sem cerimônia. Com ou sem consentimento dos ouvintes. Tento me concentrar na leitura. Mas, vencida, desisto. Afinal, não há ficção que vença a vida real de “gente como a gente”. Problemas familiares, discussões triviais entre pais e filhos e questões envolvendo trabalho, quem não os tem? Os temas recorrentes são com espelhos que refletem algo já vivido, presenciado ou compartilhado. Nessa mistura, juntam-se as informações protocolares fornecidas pelos autofalantes da embarcação e solenemente ignoradas por grande parte dos usuários no enquanto corria a barca. Campeãs de desobediência, já foram incorporadas aos nossos mantras diários e continuam insuperáveis: Senhores passageiros... estamos nos aproximando... permaneçam em seus lugares até a atracação. O que dizer do imbatível: É proibido sentar nas escadarias da embarcação. A chegada é nervosa. Os passageiros buscam a saída com passos largos e apressados. Todos sempre parecem estar muito atrasados. A multidão, ante a possibilidade de a embarcação explodir a suas costas, bate em retirada. Divirto-me com essa imagem. Quem sabe busquem a terra prometida sem Moisés? Afinal, não lembro tê-lo visto na barca. Outra imagem também me acompanha sempre. Passageiros saem da Barca e caminham robotizados rumo a uma nave espacial pairando sobre a Avenida Rio Branco. Andam em bandos guiados por seus GPSs. Não falam com os companheiros de viagem. Estejam eles a frente, após, ou ao lado. Hipnotizados por seus smarts, digitam e caminham sem desgrudarem os olhos de suas mágicas e iluminadas telinhas. Todas essas cenas fazem com que o percurso até a Avenida Graça Aranha fique mais curto e muitas vezes, mais divertido. Imaginar o que passa pelas cabeças dessas pessoas, aguça a minha imaginação e acaba sendo o meu melhor passatempo. Continuo caminhando, sem alternativa possível, no desafio dos decibéis: cartão TIM e cartão Oi com internet liberada! Frases que se misturam aos vendedores de sucos, de biscoitos e de salada de fruta natural. Passada a temporada das festas juninas o carrinho de lixo gigante, travestido de carro de som, muda o repertório e vende nova mercadoria: CD Pirata de Piadas. Não entendo nada do que falam. Mas as gargalhadas estão garantidas por já estarem inseridas na obra. Sigo em frente. Todos os dias. Num Rio de Janeiro no singular plural.
Ostra De repente uma vontade incontrolável de ser ostra, de viver meu mundo ostra. Mas, afinal? Falar pouco, almoçar sozinha, ficar comigo. Me abastecer de mim, de livros, de filmes e de silêncio. Hoje andei sem rumo e sem destino, após o almoço, pelas movimentadas ruas do centro do Rio de Janeiro O que senti? Não sei. Bem estar? Achar bom estar comigo? Talvez... Mas já não me importa tanto saber. Pelo menos por hora. Não olhei vitrines, não procurei por rostos. Não saí em busca de coisa alguma.... Aliás, não reparei em ninguém. Só queria caminhar e caminhar... e teria caminhado muito mais. Cabeça vazia, não pensar em nada. Foi muito bom. Vivam os loucos. Pena que ainda me resta alguma lucidez... Então, comecei a voltar. Voltei. Incrivelmente com uma melodia na cabeça. Trilha de um filme: A Ostra e o Vento... Por que será? Tipo assim do nada? Bom, o que sei é que a rotina me esperava no mesmo lugar de onde a deixei. Ainda não havia acabado o expediente. Então, debrucei-me no trabalho. Resolvi algumas pendências, ligações e dei rumos a questões outras. Agora, enquanto aguardo uma reunião que começa daqui as 15 minutos, liberto as palavras aprisionadas que, se de alguma forma preguiçam-se de sair da boca, por outro lado borbulham em minha cabeça pipocando pelos dedos afora. Uma ligação avisa que teremos mais uma gravação para o jornal da noite na TV. É preciso preparar o local. Embora sem programação prévia, tudo corre de forma tranquila com a melodia de Chico que não me sai da cabeça. Pego o elevador. O horário da reunião é chegado. Depois será o tempo de deixar o resto do dia escorrer pelos dedos e pelas ruas até que, finalmente, eu esteja em casa. Não tenho mais pressa de nada. Volto e termino esse texto antes de partir. Antes, procuro e encontro o tema do filme A Ostra e o Vento. Ouço a música várias vezes no fone do meu smart e enfim compreendo o que vivi essa tarde. O que o arquivo de minha memória foi buscar tão longe. Demoro mais para partir porque acho o filme na íntegra. Não dá tempo de ver na íntegra na tela do celular .... Mas contento-me com o barulho das gaivotas, do mar batendo e com trilha maravilhosa... Realmente não importa o dia e a rotina. É possível quebra-la aos poucos. Agora, tenho pressa de chegar em casa. Já sei qual será o filme dessa noite. E o que vai me embalar minha noite hoje: o som de Chico, o mar, as gaivotas, meu jeito ostras e a plena consciência da pérola que tenho guardada no meu interior. Linda.... Mas, nesse momento, só minha!